Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros RÉPLICA Zona de confronto versus zona de conforto da crítica NELSON DE OLIVEIRA ESPECIAL PARA A FOLHA Li com bastante atenção o artigo do editor da Ilustríssima, Paulo Werneck, sobre a antologia "Geração Zero Zero" (Ilustrada, 18/12). Mas confesso que, terminada a leitura, precisei verificar o cabeçalho do jornal. Fiquei em dúvida se estamos mesmo em 2010. O problema central do artigo não são as falácias de comunicação ou a piada inocente, mas o descompasso entre texto e contexto. Sinal disso é certa visão luddista do marketing. Os argumentos com falhas lógicas, de difícil comprovação ou refutação (as falácias), são muito comuns em debates e artigos de opinião. Poucos articulistas conseguem evitá-los. Mas a disfunção principal do artigo de Paulo é mesmo de cronologia. Vivemos numa época em que as verdades são provisórias, mas o artigo, cheio de certezas perenes, não aceita isso. Enquanto a Geração Zero Zero dialoga com a ambiguidade, ele cobra mais nitidez. Porém nitidez objetiva é assunto da matemática e da ciência, não da arte e da literatura, sempre subjetivas. Aliás, é bom lembrar que certas áreas das ciências exatas já aceitaram a ambiguidade inevitável. É com elas que a Geração Zero Zero interage. Nossa antologia relaciona-se, por exemplo, com o princípio da incerteza de Heisenberg e o gato morto-vivo de Schrodinger. Com a nanomedicina e as próteses neurológicas. Com a bizarra matéria escura que compõe noventa por cento do universo, mas ninguém sabe o que é. Por pertencer ao passado, o artigo de Paulo Werneck defende as leis de Newton para a criação poética. Também reforça, com desmedida bronca, a ojeriza à ideia de geração-com-recorte-temporal, procedimento comum nas artes plásticas. Isso já aconteceu antes, com a Geração 90. Mas só agora eu noto essa "gerafobia" quase consensual, esse medo exagerado de geração. A intenção primeira da nova antologia é divulgar a obra dos ótimos ficcionistas que estrearam na primeira década deste século. A intenção segunda é trabalhar na zona de confronto, fora da zona de conforto do leitor e da crítica newtonianos. A terceira intenção? Não há. Não existe qualquer intenção demoníaca oculta, de tomada do poder estabelecido, de revolução cultural etc. O escritor Santiago Nazarian escreveu em seu blog: "Não há nenhum grande plano nefasto por trás, não há nenhuma intenção perniciosa. É só (mais) uma antologia". Concordo totalmente. "Geração Zero Zero" é só (mais) uma antologia de ótimos ficcionistas brasileiros. NELSON DE OLIVEIRA é autor de "Poeira: Demônios e Maldições" (Língua Geral) e organizador da antologia "Geração Zero Zero", que será lançada no primeiro semestre de 2011 pela Língua Geral, com 21 autores de ficção nacionais. |
segunda-feira, 3 de janeiro de 2011
Século XXI
São Paulo, sábado, 01 de janeiro de 2011
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